sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Eco

Carlos que era Dora que era Lia que era Léa que era Paulo que era Juca que era Dora que era Rita que era Dito que era Rita que era Carlos que era Dora que era Pedro que era tanto que era a filha que era Carlos que era Dora que era toda a quadrilha.
Vive-se num mundo impessoal. Tão impessoal a ponto de se deparar com aquela pessoa diariamente, no mesmo horário, na fila do pão ou no metrô, e fingir que as pessoas assim são meros figurantes contratados para tornar o seu cenário diário mais vivo.
Mas nem sempre é assim. Há pessoas que, sem querer, tomam posse de características alheias. E, às vezes, nem em troca dão algo. Roubam, descaradamente, sem bater na porta, sem pedir licença, sem necessariamente comungar dos mesmos sonhos. Elas se sentam, se apresentam, ficam tímidas nos primeiros cinco minutos, riem de tudo, falam alto ou baixo e levam o que de você soou melhor: um olhar, uma piada, uma mania, um convite pro cinema ou, quem sabe, só seu tempo. Mas elas levam consigo.
Há ainda aqueles que se vêem em você. Esses largam tudo que lhes pertencem e enfiam em seus bolsos tudo o que lhes apeteceram. E é nessa troca que se perde a noção de origem. Sabe-se, sim, que o que lá existe nem sempre existiu, mesmo sem saber como tantas personalidades se fundiram e se tornaram a sua.
E será mesmo sua? Será, desde sempre, esse defeito seu? A vontade de conhecer a Grécia não surgiu ao se encantar com a leitura daquela tragédia grega que ele te recomendou? 
Cada um tem um pouco dos outros em si. Sejam eles inferno ou céu. Tentar dividir o que foi juntado é perda. Perde-se o eco e vira-se um.

domingo, 26 de outubro de 2008

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As mãos não mais se encaixam ao corpo. São autônomas. Suam, respiram, escrevem, sonham.
Perambulam habilmente e, sem querer, sentem. Do rosto às pontas dos cabelos lisos, da nuca aos olhos que são olhos e mais nada.
Tão pequenas, poucos centímetros. São enormes, gigantescas quando reconhecem-se...
Têm vida própria mas são só mãos sem corpo.